segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

A "Não Reforma Agrária" do MDA/INCRA no Governo LULA

23 de Abril, 2006, publicado no Ação Terra

A experiência da participação na equipe de Plínio de Arruda Sampaio no segundo semestre de 2003, para elaborar o primeiro documento que deveria ser o II PNRA, foi muito importante para que se pudesse reforçar a consciência de que em política vale tudo, menos ética e moral. No governo de FHC do PSDB não foi diferente, no governo Sarney do I PNRA também não foi diferente. Aliás, na ditadura militar, também não foi diferente. Mas, os intelectuais sempre acham que chegará um dia do primado da ética e da moral também na política.

Ariovaldo Umbelino de Oliveira

“O que que há meu país O que que há ... Tá faltando consciência Tá sobrando paciência Tá faltando alguém gritar ...” 1. Um pouco da História ... A experiência da participação na equipe de Plínio de Arruda Sampaio no segundo semestre de 2003, para elaborar o primeiro documento que deveria ser o II PNRA, foi muito importante para que se pudesse reforçar a consciência de que em política vale tudo, menos ética e moral. No governo de FHC do PSDB não foi diferente, no governo Sarney do I PNRA também não foi diferente. Aliás, na ditadura militar, também não foi diferente. Mas, os intelectuais sempre acham que chegará um dia do primado da ética e da moral também na política. O intelectual José Juliano de Carvalho Filho da FEA – USP e da ABRA 4 em um feliz artigo publicado em “O Globo” de 20/01/2006, foi brilhante na crítica aos dados de 2005 divulgados pelo MDA/INCRA sobre a reforma agrária no governo LULA: “Controvérsia sobre números não é novidade quando se trata de reforma agrária. Quem acompanha a política agrária no Brasil deve se lembrar de várias situações em que este fato ocorreu. Chegou a vez do governo Lula. No governo Figueiredo final do período ditatorial houve controvérsia sobre os números da reforma. Naquela época, final de 1984, foi oficialmente anunciada a emissão do milionésimo documento de titulação de terra. O governo de então apontava este fato como evidência de que estava em curso no país o maior programa de reforma agrária do mundo. Os jornais publicaram várias análises. Manifestei-me a respeito em artigo publicado pela Folha de S. Paulo à época: O milhão de títulos anunciados refere-se a uma série de documentos, entre os quais se incluem títulos de propriedade definitivos para agricultores sem terra, para posseiros que já ocupavam a terra e títulos com direito a ocupação provisória. Evidentemente, a dita maior reforma agrária do mundo, e dos militares, não ocorreu. Cabe também relembrar o óbvio, ou seja, os movimentos sociais foram perseguidos e reprimidos nesse período negro da nossa história.” Assim, como a música de Raul Seixas, “E anos 80” e seu verso certeiro: “E anos 80, a charrete que perdeu o condutor”5 mostrou simbolicamente, ocorreram muitas derrotas/vitórias na luta pela reforma agrária no país. O Brasil dos militares não fez a reforma agrária do Estatuto da terra, mas a sociedade civil ganhou o MST que reforçou a luta que a CPT já fazia desde a década de 70. Ganhou-se o I PNRA, no governo Sarney, mas o Brasil perdeu Marcos Freire, ministro da Reforma Agrária. Veio a Constituição “cidadã” de 1988, mas, a reforma agrária perdeu a possibilidade histórica de desapropriar terras produtivas concedida pelo Estatuto da Terra de 1964. Certamente, é possível pensar que o PT tenha começado a perder seu norte na eleição de 1989, e todos que o ajudaram em sua construção, perderam o partido que poderia começar a revolucionar a sociedade brasileira. Quem sabe aí, pode ter desaparecido na história política do Brasil, a possibilidade de um partido transformar este país. É possível também, pensar que sucumbiu aí, mais uma das teses ortodoxas de um determinado tipo de marxismo. Mas, também é possível pensar que neste momento, uma nova alternativa estava nascendo no campo brasileiro, o cada vez mais forte movimento camponês moderno. Aliás, contrariando intelectuais, políticos de esquerda e quem sabe, parte de seus próprios dirigentes. Feita a digressão, é preciso voltar ao texto de CARVALHO FILHO: “Em dezembro de 1995, primeiro ano do governo FHC, o presidente da República afirmava na imprensa ter conseguido cumprir a meta de campanha, assentando mais de 40 mil famílias. O MST questionava os números oficiais, apresentando o número de famílias assentadas em 1995, como inferior a 15 mil. De acordo com o MST, a diferença se devia ao fato de que FHC, para chegar à meta de 40 mil famílias assentadas naquele ano, somara títulos de regularização fundiária de processos que vinham de governos anteriores e, ainda, de títulos de posseiros. Para o MST, a meta anunciada pelo governo se referia a 40 mil novas famílias que seriam assentadas. Durante a campanha pela reeleição, sempre a inflar seus supostos feitos, o então candidato FHC afirmava pelo site do Incra: O Brasil está realizando a maior reforma agrária em curso no mundo. Na televisão, na propaganda oficial, ator famoso anunciava: Uma família assentada a cada cinco minutos. O segundo mandato, marcado pela chamada reforma agrária de mercado de FHC, desmontou conceitos e condições para uma distribuição fundiária efetiva. Duas linhas de atuação norteavam o governo. De um lado, agressividade na implementação da política fundiária, anúncio de medidas e números, sempre, com razão, contestados. De outro, com a conivência da mídia, crítica contínua aos movimentos sociais, sobretudo o MST com os objetivos de desqualificá-los, enfraquecê-los e criminalizá-los. Essa outra maior reforma agrária em curso no mundo também não ocorreu.” CARVALHO FILHO certamente há de concordar que é preciso continuar registrando para a história, que no interior do segundo mandato de FHC, existiu também, pela primeira vez na história da humanidade, a “Reforma Agrária Virtual dos Correios”. Ou seja, aquela que só ocorreu na televisão para iludir os camponeses sem terra. Quem sabe, FHC ou o PSDB, ou o próprio ministro Raul Jungmann, um dia poderão dar notícia da mesma, para o registro da história. A midia brasileira foi tão conivente com este falso programa de reforma agrária, que nunca mais, ele foi objeto de uma reportagem sequer. O que permite entender que a grande midia só defende a propriedade privada da terra, e mais, que uma parte dos repórteres, não tem a mínima consciência sobre o que escrevem e/ou falam sobre a propriedade privada da terra na sociedade capitalista. Quando foram realizadas as reuniões para formular o II PNRA, encontrou-se no INCRA, um cadastro de mais de 1,2 milhões de brasileiros que tinham sido iludidos pelo PSDB do então presidente FHC. Este partido tem muita conta para prestar à sociedade brasileira. Aliás, ele tem sido um partido do “faz de conta”, “faz de conta que sabe fazer”, “faz de conta que fez”, “faz de conta que irá fazer”, etc, etc, etc. Mas, agora são os camponeses que novamente estão sendo iludidos. Iludidos pelo MDA/INCRA. A pergunta a ser feita é: o Presidente LULA sabia/sabe que o MDA/INCRA está fazendo um “quarto da reforma agrária” prevista na Meta 1 do II PNRA? Ou seja, aquela que interessa diretamente aos movimentos socioterritoriais que formam a Via Campesina e o Fórum da Reforma Agrária?

Doc. Completo:

A “Não Reforma Agrária” do MDA/INCRA no Governo Lula