terça-feira, 10 de outubro de 2006

Tortura na Febem-SP continua até em unidades pequenas

E para comemorar o PSDB no governo do Estado de São Paulo por mais, no mínimo, 4 anos, vamos à situação da Febem. E rezemos para não os colocarem também na presidência. pelo amor de Deus!! Tirada do site carta maior

Tortura na Febem-SP continua até em unidades pequena

Ao contrário do que afirma governo de São Paulo, funcionários de unidades consideradas “modelo” também usam da prática de tortura supostamente para manter problemas de disciplina sob controle. Em Bauru, no interior do estado, internos apresentam marcas de violência. Bia Barbosa – Carta Maior São Paulo – O filho do comerciante Silas Aparecido Moreira é uma das vítimas mais recentes do modelo repressivo de tratamento dos adolescentes em conflito com a lei que estão sob a custódia do governo de São Paulo. Com 18 anos recém-completados, ele cumpre medidas socioeducativas há nove meses por tráfico de drogas na Unidade de Internação da Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor) em Bauru, no interior do estado. No dia 7 de setembro, o adolescente escreveu na lousa da sala de aula “paz, liberdade e justiça”. Por isso, foi acusado de ser membro do PCC. Levado para o castigo, ele apanhou muito. “Bateram tanto no meu filho que ele chegou a urinar sangue. Ele tomou muita pancada no rim e na cara”, conta Moreira. O comerciante procurou imediatamente o diretor da unidade de Bauru, Antonio Alfredo Costela Parras, que lhe garantiu que isso não acontecia ali dentro. “Mas só três semanas depois levaram meu menino pra fazer exames. Claro que, depois desse tempo, não deu nada. O relatório de comportamento do meu filho é bom; ele nunca teve problemas. Agora está sofrendo represálias. Os funcionários que bateram nele estão colocando outros jovens contra ele. Meu moleque está revoltado com o espancamento que recebeu. O diretor disse que vai transferi-lo para Iaras, mas assim eu não vou ter como ver o meu filho”, lamenta Silas Moreira. A denúncia de Silas foi feita na última semana quando um grupo de familiares e funcionários da Febem de Bauru procurou o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), órgão oficial criado pela Constituição do Estado de São Paulo para apurar violações de direitos humanos. Eles entregaram ao Condepe um dossiê com termos de declarações elaborados pela Comissão de Direitos Humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Bauru e boletins de ocorrência que descrevem detalhadamente os casos de tortura e abusos envolvendo o próprio diretor da unidade e outros funcionários. Entre as denúncias de tortura, humilhações e abusos estão ocorrências de choques elétricos, espancamentos, trancamento de internos em celas por 75 dias, ameaças de morte, abusos sexuais e o caso de um interno que teve deslocamento de retina após apanhar dos monitores. De acordo com os funcionários que procuraram o Condepe, a Ouvidoria e a Corregedoria da Febem foram comunicadas das ocorrências em fevereiro, mas nenhuma providência teria sido tomada até então. “Nós víamos os meninos marcados, mas ele morrem de medo de falar o que acontece. Em fevereiro as torturas se acentuaram. No dia 12 de abril, eu presenciei o espancamento de dois adolescentes. Eles apanharam tanto que saía sangue pela boca”, contou à Carta Maior Roseli Diccine Mariano, que era coordenadora pedagógica da Unidade de Internação de Bauru. Era ela quem coordenava a rotina dos 72 adolescentes internos. Quando denunciou as agressões, foi destituída de seu cargo e impedida de entrar na administração da unidade. A direção também proibiu outros funcionários de conversarem com ela, depois a transferiu para o atendimento de adolescentes em regime de liberdade assistida. Roseli desenvolveu um quadro de hipertensão e hoje está em licença médica. Ela e outros funcionários que denunciaram as práticas da direção de Bauru foram afastados e se dizem com medo. “Agora, quem é responsável pela rotina dos adolescentes são os funcionários da disciplina, os mesmos que bateram nos meninos. São pessoas sem preparação nenhuma, que estão destruindo a possibilidade de recuperação desses jovens. Isso não é um problema só de modelo; é de abuso, de desrespeito à dignidade humana e de doutrinação, algo muito diferente de educação”, avalia Roseli. “Tenho vergonha, como educadora, de ter que denunciar quem deveria estar do nosso lado na educação dessas pessoas. Quando a gente diz que quer recuperar um jovem da Febem, é para recuperar o país. Não vamos desistir da crença no ser humano. Acredito que há uma recuperação, mas pra isso é preciso seguir o caminho certo. Só que é uma atrocidade o que está acontecendo lá dentro. A gente fica doente de ver o martírio dessas crianças. O ser humano dá o que recebe. Se recebe violência, como vai devolver carinho?”, questiona a funcionária da Febem. O Condepe conseguiu, na última sexta (6), o afastamento de Antônio Parras da direção de Bauru. Antes de assumir o comando da unidade, Parras trabalhou no Centro de Detenção Provisória (presídio) do município e na Corregedoria da Febem. De acordo com as entidades de direitos humanos, ele responde a um processo por desvio de dinheiro público e improbidade administrativa. “Percebe-se que é uma pessoa com “gabarito” para ser da Corregedoria da Febem”, ironiza Ariel de Castro Alves, coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos e membro do Condepe. “Desde fevereiro os funcionários estão denunciando na Corregedoria o que está acontecendo, sem que se tomem providências. Há uma omissão da instituição neste sentido. Bauru é uma unidade pequena, que deveria ser modelo. Mas o que está acontecendo lá desmonta o argumento do governo de São Paulo de que os problemas estão só nos grandes complexos”, afirma. O programa de governo de Geraldo Alckmin fala, por exemplo, da descentralização do atendimento aos adolescentes em conflito com a lei, com investimentos na construção de pequenos centros para internação e ressocialização. “Essa é uma questão de formação, de impunidade e de corporativismo”, acredita Alves. Em nota de esclarecimento enviada à imprensa, a Febem explica que o afastamento de Antônio Parras foi preventivo, e “visa a dar maior transparências às investigações, que serão feitas pela corregedoria da instituição, sobre as denúncias apresentadas pelos representantes do Condepe à Secretaria Estadual da Justiça e da Cidadania”. Com isso, assume a direção de Bauru a funcionária Juliana Rosa que, até então, dirigia a unidade Rio Novo, na cidade de Iaras, a cerca de 150 km de Bauru. Boas-vindas No final da tarde desta sexta, a nova diretora da unidade de Bauru, Juliana Rosa, recebeu a visita de entidades de defesa dos direitos humanos, que foram até a cidade verificar as denúncias feitas pelos funcionários. O cenário descrito pelos integrantes do Condepe, da Comissão de Direitos Humanos da OAB e do Conselho Tutelar é, além de degradante, assustador. “Os internos vivem ali dentro como se fossem robôs. Têm que andar de cabeça baixa, com as mãos pra trás o tempo todo. Se reclamam de alguma coisa, recebem tapas na cara. Alguns funcionários batem mais do que outros; alguns cospem na cara dos internos. O divertimento deles é mandar os adolescentes rolarem nus no chão. Outros mandam os jovens tirarem a roupa, ficarem de quatro e latirem como cachorros. É a humilhação completa, a permissividade total. Dessa forma você animaliza qualquer ser humano. Me lembrou Abu Graib [presídio do Iraque que ficou conhecido em todo o mundo depois que fotos de cenas de tortura praticadas pelo exército americano foram divulgadas]”, conta Paulo Sampaio, da Associação dos Cristãos para a Abolição da Tortura (ACAT). Na descrição do representante da OAB, Francisco Lúcio França, o local parece um "campo de concentração nazista", onde não se pode sorrir nem expressar o menor sentimento. A unidade conta com quatro celas na chamada “sessão disciplinar”. Ali, os internos são deixados de castigo por longos períodos. A cela não tem entrada alguma de luz. “Os meninos ficam sentados no cimento durante todo o tempo. Às 22h recebem um colchão, que é recolhido às 6h. O lugar parece uma valeta de cemitério. Vimos três internos nessa situação. Um vai ficar de castigo por 30 dias porque trocou a sandália com o irmão durante a última visita. Outro porque desenhou um menino fumando no caderno”, conta Paulo Sampaio. “Um adolescente de 14 anos que já tinha ficado no castigo, ao saber que corria o risco de ir pra lá de novo, tentou se enforcar com uma camisa. Depois levou uma surra porque tentou se matar”, relata. Durante a visita, as entidades pediram para a nova diretora escolher cinco adolescentes aleatoriamente. Ao tirarem a camiseta, todos apresentavam marcas de espancamento. As entidades de direitos humanos solicitarão esta semana ao Ministério Público e ao governo de São Paulo que os internos passem por exames de corpo de delito. A OAB de Bauru tentará entrar na unidade nesta segunda para se certificar de que os internos não apanharam no final de semana em represália ao que disseram durante da visita do Condepe de sexta-feira. De acordo com os internos, a última vez que apanharam de maneira generalizada foi no dia 7 de setembro – mesmo dia em que o filho do comerciante Silas Moreira foi surrado. Mas os adolescentes temem o que os espera neste feriado de 12 de outubro. Já sabem o que pode ser seu presente de Dia das Crianças.

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