sexta-feira, 10 de fevereiro de 2006

Contra a lei, juízes barram desapropriações

Contra a lei, juízes barram desapropriações

EXCLUSIVO – Mais de duas mil famílias já poderiam estar assentadas em São Paulo se magistrados cumprissem a lei

Marcelo Netto Rodrigues da Redação do Jornal Brasil de Fato, ed. 153 Cerca de 34 mil hectares de terras, de vinte e duas fazendas, já poderiam estar nas mãos de 2.110 famílias sem-terra acampadas do Estado de São Paulo se os juízes responsáveis pelas desapropriações dessas áreas estivessem cumprindo a lei. O dinheiro referente às indenizações - R$ 153 milhões - já está depositado - em alguns casos, há oito anos. Mesmo assim, as famílias continuam vivendo embaixo de lonas. A lei do rito sumário diz que uma vez depositado o dinheiro em juízo, o juiz tem 48 horas para dar imissão na posse ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Só depois, se fosse o caso, esse mesmo juiz avaliaria se a indenização estipulada é justa ou não. Porém, essa ordem natural dos fatores está sendo invertida deliberadamente pelos juízes, para que, entre outras conseqüências, os fazendeiros ganhem tempo para "mascarar" os seus imóveis. "No lugar de conceder a imissão na posse imediata ao Incra, os juízes estão julgando previamente uma ação declaratória de produtividade emitida pelos próprios fazendeiros, valendo-se de uma lei ordinária do Código Civil (menor à lei do rito sumário) que trata da relação de compra e venda entre particulares", diz Antônio Storel, engenheiro agrônomo e assessor do Incra-SP. A situação beira o ridículo, uma vez que a ação desapropriatória é entre o poder público e um particular. Mas, apesar da evidente contradição e má-fé, os juízes se defendem dizendo que apenas seguem um acórdão emitido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), no ano 2000.

Dinheiro Vivo

Os magistrados que desrespeitam o rito sumário - rejeitando a prévia imissão na posse ao Incra - argumentam que agem para prevenir problemas aos fazendeiros. E, para que não restem dúvidas, acabam pedindo a confecção de laudos atestando a produtividade da área inclusive a peritos judiciais que mantêm páginas na internet com os dizeres: "Incra - reforma agrária: como se prevenir". Defendem eles, os juízes, que os fazendeiros estariam sendo prejudicados se, no curso da ação desapropriatória por interesse social para fins de reforma agrária, ficasse provado que a área cumpria, sim, sua função social. E que em vez de receber a indenização da terra nua em dinheiro vivo, eles estariam sendo pagos em Títulos da Dívida Agrária (TDAs) - cujo resgate se dá na proporção do imóvel, em um prazo que varia de 5 até 20 anos. "Só no Brasil acontece isso. A imissão na posse deve vir primeiro, para depois se discutir todo o resto. E mesmo que o Estado fosse obrigado a recuar das TDAs, essa situação estaria contemplada pela lei 4132/62, que desapropria áreas no campo por interesse social, com pagamento em dinheiro. Não há a menor justifica em atrasar a posse para o Incra", contra-argumenta Storel.

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