sábado, 18 de fevereiro de 2006

Pastoral fará ato contra absolvição do coronel Ubiratan

Pois é, como nosso amigo bem disse no comentário, o coronel foi solto. Por puro facismo dos desembargadores que o julgaram. A tal da mentalidade nazista que eu tenho me perguntado de onde provém. Encontrei essa pequena notícia no ig, mas que menciona um movimento bem interessante: a pastoral carcerária. Entrando em seu site, encontrei vários arquivos para serem baixados. Após a reportagem, abaixo, há uns fragmentos de um dos documentos que li, que ilustra bem a visão de o que é ser preso, de quem é o preso e o que ele passa. Coisas que, aliás, os desembargadores deveriam ler. E outras vááárias pessoas que têm o discursinho feito dos "direitos humanos para as pessoas de bem". Vai o link para o site da pastoral - que vai ficar fixo aí do lado - e para o downloaddo texto completo. E até mais!

Pastoral fará ato contra absolvição do coronel Ubiratan

Agência Estado do site último segundo/ig A Pastoral Carcerária, um serviço da igreja católica, protestou hoje contra a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo de anular a condenação do coronel da reserva da Polícia Militar e deputado estadual Ubiratan Guimarães (PTB), responsável pela operação que resultou na morte de 111 presos na Casa de Detenção do Carandiru, em 2 de outubro de 1992. "Estamos de luto porque, para nós, a impunidade foi oficializada", resumiu o vice-coordenador nacional da Pastoral Carcerária, Padre Valdir João da Silveira. Em Brasília para participar de um seminário sobre questões jurídicas do sistema prisional brasileiro, Padre Valdir levou seu protesto ao Ministério da Justiça. "Foi dada licença para matar. A decisão do Tribunal de Justiça, que votou pela impunidade dos assassinos do massacre do Carandiru, será a responsável pelos próximos massacres", disse em reunião com o chefe do Departamento Penitenciário do Ministério, Maurício Kuhene. Inconformadas com a declaração de inocência do coronel Ubiratan, várias entidades ligadas aos direitos humanos vão se unir à Pastoral da Carcerária em uma grande manifestação de protesto marcada para segunda-feira (20) em São Paulo. Segundo o padre Valdir, os manifestantes irão se reunir na escadaria da Catedral da Sé e fazer uma caminhada pelas ruas do centro da cidade. Cento e onze manifestantes foram escalados para levar cartazes com o nome de cada um dos mortos no massacre do Carandiru. "Será um ato ecumênico, com a participação de movimentos sociais e de direitos humanos, além de um grupo de rap para animar a manifestação", adianta padre Valdir. Com a lista das vítimas nas mãos, ele fará a "chamada" e a cada nome citado o manifestante com o respectivo cartaz deitará no chão para simbolizar a morte do preso. A chamada será sucessiva, até que todos os 111 manifestantes estejam no chão. Também estarão presentes familiares dos mortos do Carandiru, que já se queixaram à Pastoral Carcerária do temor generalizado da reação da polícia. "Ficou claro que assassinos poderão até ser homenageados. Afinal, o quartel da Polícia Militar parou para recepcionar o coronel Ubiratan e homenageá-lo", protestou o padre. "A PM , que é responsável pela segurança de todos os cidadãos, também foi conivente", emendou. Segundo ele, a Pastoral está reunida em Brasília com órgãos do Ministério da Justiça, para que possa acompanhar o sistema prisional e cobrar atitudes mais enérgicas e mais rápidas das autoridades, para impedir e denunciar maus-tratos aos presos. Pastoral Carcerária Apostila de Formação Básica O PRESO Por que uma pessoa é condenada à prisão? Condenar uma pessoa à prisão é o resultado do julgamento que a sociedade faz de quem cometeu um delito, visando afastá-lo do convívio social para proteger a sociedade de novos crimes e dar oportunidade à pessoa condenada de corrigir-se. Como entender o fenômeno da criminalidade? A comunidade científica que melhor estuda a criminalidade já produziu importantes estudos, pesquisas e conhecimentos suficientes que nos permitem entender de forma mais ampla o fenômeno da criminalidade. Podemos destacar alguns elementos: • não é hereditária: não é transmitida de pais para filhos; • não é congênita: ninguém nasce criminoso; • não é biológica: não é característica específica de gênero, de raça ou de etnia; • não é geográfica: não está limitada a determinados espaços geográficos; • não é cultural: não afeta apenas pessoas de baixa cultura ou de baixa escolaridade; • não há uma causa única para explicar porque uns se tornam criminosos e outros não. Quais as causas principais da criminalidade no Brasil? No Brasil a criminalidade afeta todas as camadas da estrutura social, podendo-se afirmar que: • a concentração econômica distribui de forma desigual o emprego e a renda; • a não fixação do homem à terra modifica suas formas de organização sócio-familiar e elimina os meios básicos de ocupação e de produção; • a migração contribui para a formação de bolsões de pobreza nos centros urbanos; • a ocupação desordenada do espaço urbano permite a criação de núcleos residenciais sem a necessária infra-estrutura de serviços e de atendimento básico ao cidadão; • a rápida alternância nos valores, nas tradições e nos costumes modificam a estrutura da família e suas formas de organização; • a família não consegue atender às necessidades básicas de seus membros; • a sociedade impõe aos indivíduos, sobretudo crianças, adolescentes e jovens, valores, objetivos e necessidades de consumo além de sua capacidade. Qual é o perfil da população prisional no Brasil? Foi estimado que em nosso país existem mais de 230 mil presos no sistema penitenciário e ainda 90 mil em delegacias, totalizando 320 mil (segundo dados do mês de outubro de 2001) • mais de 95% dos presos são homens; • cerca de 85% das mulheres presas são mães; • mais de 50% são negros e pardos; • mais de 90% dos presos brasileiros são originados de famílias desestruturadas; • mais de 80% dos crimes são contra o patrimônio individual, público ou empresarial; • mais de 90% têm menos dos que os oito anos de estudo constitucionalmente garantidos; • mais de 90% são condenados a cumprir pena em regime fechado; • cerca de 70% dos que saem da prisão acabam retornando; • menos de 10% dos presos possuem características criminológicas que justifiquem regime disciplinar e medidas de segurança mais rígidas. Este quadro alimenta o imaginário social brasileiro que, com sabedoria, associa criminalidade à desigualdade social e à seletividade do sistema de justiça criminal. Tal sistema pune os mais vulneráveis e possibilita os mais privilegiados escapar da ação da justiça. Por que os presos fazem rebelião? Toda rebelião é um grito de desespero. A Pastoral Carcerária, porém, não é contra a condenação daqueles que cometeram algum crime, mas sim contra a maneira injusta, muitas vezes desumana com que devem pagar essa pena. O grito dos presos começa com a injustiça cometida na maneira pela qual eles são presos, ou melhor, caçados. Pior do que com os animais. São caçados como culpados... enquanto a Lei diz que todo cidadão é inocente até ser declarado culpado pela justiça. O grito de revolta continua quando o condenado é recolhido à prisão. No primeiro mês deveria passar por um período de classificação. Nada disso é feito. Os presos são todos amontoados juntos, sem sol, muitas vezes sem ar ou condições de vida humana. Esse momento de triagem não realizado faz surgir o grito abafado pelas paredes da masmorra onde estão recolhidos. O grito do preso é um grito de revolta por não ser considerado pessoa humana. Ele é condenado a pagar sua pena, mas também é condenado para ter a oportunidade de se recuperar. Isto não existe. A única lei da cadeia é a segurança máxima para impedir fugas. A falta de ajuda jurídica é outro sério problema enfrentado pelos presos. Sendo esta, em parte, a causa de uma rebelião e duas tentativas de fuga diárias no Brasil. O preso está na mão dos outros e sem assistência jurídica, pois 95% são pobres e 85% não têm condições de contratar um advogado. A igualdade é negada na cadeia. Quem disse que todos eram iguais perante a Lei? Não para o preso. Ele vive na desigualdade. Desse crime o judiciário é o responsável. O preso se revolta porque juízes, banqueiros, políticos e outros não são condenados. Por que só o pé de chinelo é condenado, se todos são iguais perante a lei? A falta de comida é outro fator que muito contribui para a revolta. Existem casos de dinheiro destinado à compra de alimentos para os detentos ser desviado em certos setores do sistema carcerário. Estômagos vazios, roncando de fome, desespera os presos. Quem é o responsável? Os presos ou alguns diretores e guardas que usam de corrupção? Torturar o preso é uma nefasta prática infelizmente muito difundida. Eles são torturados nas celas fortes, nos escritórios, nos carros, nas picadas escuras e afastadas; tortura-se antes, durante ou depois da prisão, tortura-se o preso do norte ao sul do Brasil. A falta de assistência médica nas prisões deixa muitos presos com membros quebrados, cabeça rachadas, pulmões e rins inutilizados, paraplégicos por falta de assistência médica! A falta de recuperação na ausência de educação, na ausência de assistência religiosa é de quem? Cumpre ainda indagar se a culpa é do preso ou de todas as autoridades? Judiciário, Executivo, Igreja? A família do preso é tragicamente abandonada. Quem é culpado de as mulheres dos presos, em grande parte dos casos, serem obrigadas a se prostituírem para dar pão aos filhos? O preso? Quem é responsável pelas crianças abandonadas obrigadas a viverem, em muitos casos, na rua para sobreviverem? Por que a sociedade é contra o preso? "Os homens por natureza se comportam na presença do sofrimento como as galinhas que se atiram a bicadas sobre a galinha ferida. Todos desprezam os infelizes em maior ou menor grau." A população pobre é o alvo privilegiado da pancadaria policial e do terror que freqüenta os fedorentos corredores e celas de delegacias, distritos policiais e cadeias. Os pobres, os que desde o começo entraram na vida como perdedores, tornam-se os bodes expiratórios da sociedade. Os meios de comunicação social têm um papel determinante na formação de opinião da sociedade, educando o povo com o seguinte ditado: "Pau que nasce torto, não tem jeito, morre torto". Como se houvesse uma predisposição de algumas pessoas ao crime. As imagens apresentadas de rebeliões, de fugas ou de revolta dos preso nunca mostram as causas, as situações que antecedem as atitudes extremas dos detentos. É apresentado sempre só um lado da moeda, o da instituição jurídica, do poder executivo, dos funcionários do sistema prisional. A violação sofrida pelos presos e seus familiares sempre é ocultada.

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