quinta-feira, 15 de dezembro de 2005

Investimentos estrangeiros produzem efeitos perversos nos países africanos: Enriquecem os investidores em detrimento das economias nacionais

Philippe Bernard Em Paris artigo publicado na edição do dia 16.09.2005 do jornal Le Monde, traduzido por Villy. A ONU analisa a "marginalização" do continente africano: será que atrair os investimentos estrangeiros para a África, privatizando e limitando o papel dos Estados, permite garantir o desenvolvimento? Seguramente não, responde a Conferência das Nações Unidas para o comércio e o desenvolvimento (CNUCED) num relatório que foi publicado nesta terça-feira (13/09), no momento em que está sendo realizada a cúpula da ONU em Nova York. O documento, que atropela um bom número de idéias liberais dominantes, as quais acabaram conduzindo à aplicação do "remédio de cavalo" do "ajuste estrutural" imposto à África e à redução da ajuda pública, baseia-se numa constatação calamitosa: o fluxo dos investimentos estrangeiros diretos aumentou sensivelmente desde os anos 90, mas o continente negro não parou de perder terreno na escala planetária. De fato, ele recebe apenas 2% a 3% dos fluxos mundiais de capitais contra 28% em 1976, enquanto a sua participação no comércio internacional é apenas superior a 2%, contra 6% em 1980. "A África está marginalizada dentro de uma economia cada vez mais globalizada", explica assim este relatório que, no seu título, apela a "repensar o papel dos investimentos estrangeiros diretos". Multiplicação dos enclaves dedicados à exportação de recursos provenientes da mineração, os quais são entregues para sociedades transnacionais que não têm nenhum vínculo com a economia local; separação entre os interesses dos investidores estrangeiros e os dos países que os acolhem; generosos incentivos fiscais que comprometem as receitas dos Estados; busca do lucro imediato em detrimento da extensão das capacidades de produção; peso da história colonial que limita a diversificação dos parceiros... É extensa a lista dos processos que transformam os investimentos estrangeiros em instrumentos de "integração" na economia mundial, em detrimento da consolidação das economias nacionais, e que fazem com que os fluxos capitais pretensamente salvadores sejam, de fato, um "verdadeiro perigo". Enquanto na África os três quartos dos investimentos estrangeiros convergem para os 24 países produtores de petróleo e de minerais, o setor agrícola beneficia pouco dos capitais exteriores. Ele permanece confinado à produção bruta, mas não conduz à emergência de um setor agro-alimentício ou têxtil. Contudo, esta mutação permitiria acabar com a dependência em relação aos produtos de base, cujas cotações são incertas. O relatório aponta o fato de que em Gana, onde as exportações de ouro triplicaram em quinze anos, o Estado recebeu apenas 5% do valor total dessa dádiva. Na África do Sul e no Gabão, as retiradas de lucros ultrapassaram as contribuições com investimentos estrangeiros. O relatório lembra que três países apenas --os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a França-- geram 70% dos fluxos. Um erro básico de análise é responsável em grande parte por esses resultados "no melhor dos casos decepcionantes": os africanos foram incentivados a abrir suas fronteiras antes que a sua economia seja competitiva. Assim fazendo, não foi levado em conta que os investimentos estrangeiros "acompanham o desenvolvimento, sem estimulá-lo efetivamente". O relatório chega até mesmo a amenizar o peso da má governança africana, as, baseando-se nos raros exemplos de sucesso --Botsuana, Ilhas Maurício--, ele apela à implantação de políticas de Estado que sejam capazes de "mobilizar os recursos domésticos "por meio da retomada dos investimentos públicos e da formação de uma função pública" independente e competente".

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